Pular para o conteúdo principal

PROJETO DESENVOLVE HISTÓRIAS EM QUADRINHOS ACESSÍVEIS PARA COMUNIDADE INDÍGENA TERENA


Você conhece alguém surdo? Imagine a dificuldade estabelecida pelas pessoas surdas e ouvintes tentando se comunicar sem saberem língua de sinais! Principalmente, no território brasileiro, com as pessoas que desconhecem a Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Agora imagine um índio, surdo. Um índio da etnia terena. A comunidade deste índio tem uma língua materna, o terena, a língua própria da sua aldeia. Os índios dessa aldeia falam português também, como segunda língua, mas toda a cultura e a identidade estão baseadas na língua materna terena.

Este índio, surdo, precisa desenvolver uma forma de se comunicar com sua própria comunidade – majoritária Terena oral. O problema é que, nas escolas, a língua de sinais que ele vai aprender é a que conhecemos como Libras, criada e usada por não-índios.

A Libras é uma língua sinalizada oficializada após muitas lutas de uma língua de minoria. No entanto, as demais línguas sinalizadas, indígenas, por exemplo, a Terena, ainda não alcançaram esse status político e linguístico.

Dessa forma a Libras acaba exercendo a função de língua dominante nas escolas indígenas e devido a isso as línguas indígenas de sinais não têm sido o alvo de comunicação nas escolas indígenas.

Assim, o índio terena acaba por perder muitas informações da sua cultura – coisas que só poderiam ser expressas, explicadas, através da sua língua materna indígena. Ocorre que, por uma dinâmica própria da comunidade, os índios criaram sua própria língua de sinais, a Língua de Sinais Terena.

Junto a isso, “é importante também levar para comunidade de surdos brasileira que utiliza a Libras que existem outras línguas sinalizadas no próprio país e precisa ser um conteúdo escolar para não reproduzir o conceito de que existe uma única língua de sinais no Brasil e uma delas é a terena”, explica a pesquisadora doutora Kelly Priscilla Lóddo Cezar da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Para tentar sanar essas lacunas e dizimar as línguas de minorias, cultura, história e estruturas linguísticas, a linguista Kelly desenvolve o projeto de pesquisa institucional “HQ’s Sinalizadas” que se objetiva a criação de materiais de histórias em quadrinhos para comunidade surda de diferentes línguas, como o terena.

A HQ terena intitulada “KAXE A KOIXOMUNETI SURDA” (Kaxe a pajé surda) que será lançada ainda este ano é resultado de dois anos de pesquisa do orientando Ivan de Souza, nos projetos de iniciação científica – Programa Institucional de apoio a inclusão social UFPR/Fundação Araucária (2018-2020) e será resultado de trabalho de conclusão de curso do curso de licenciatura de letras libras da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Como todos os trabalhos de histórias em quadrinhos, toda produção conta com uma equipe multidisciplinar para criação de uma HQ sinalizada – línguas de sinais e escrita da língua oficial – a presente criação conta com a participação especial das pesquisadoras Shirley Vilhalva, Denise Silva, Priscilla Sumaio que resultou em um estudo bibliográfico apurado sobre o tema e cristalizou o roteiro – produção final das iniciações científicas. A partir de janeiro de 2020, contamos com a ilustradora Julia Alessandra Ponnick que “agarrou a ideia” de ilustrar o roteiro.

A contribuição social desejada e a ampla divulgação para comunidade surda – impressão do material e distribuição gratuita para escolas púbicas indígenas é uma realidade possível devido à parceria com o Ipedi (Instituto de Pesquisa da Diversidade Intercultural), o projeto busca apoios para a impressão dos HQs em formas de gibis, para distribuição em escolas públicas indígenas e escolas bilíngues para surdos no Brasil.

A grandeza da efetivação desses materiais disponíveis, vão ao encontro das considerações tecidas pelo historiador e pesquisador Paulo Vaz de Carvalho,  de Lisboa, Portugal que acompanha as produções desenvolvidas pela linguista Kelly Cezar e seus orientados no Brasil, nas palavras do investigador: “A produção de materiais didáticos e pedagógicos para a educação de surdos é hoje uma área central e incontornável para uma aplicação real da educação bilíngue de crianças e jovens surdos, dando cumprimento ao que está legislado em muitos países, mas pouco aplicado na prática, se tivermos em conta o verdadeiro significado do conceito de bilinguismo. A verdadeira inclusão das pessoas surdas está ancorada no conceito de acessibilidade”, afirma Paulo Vaz de Carvalho, coordenador do Centro Educação e Desenvolvimento Jacob Rodrigues Pereira, de Lisboa, Portugal.

SINOPSE:
A HQ criada KAXE A KOIXOMUNETI SURDA se desenvolve com os acontecimentos marcantes da história verídica desse povo terena. O enredo tem como personagem principal uma mulher indígena surda anciã chamada Kaxe. Ela exerce a função religiosa de pajé - Koixomuneti, na língua terena - nesta comunidade. Ao ser chamada para auxiliar em um parto - ritual típico - e após pedir a benção dos ancestrais para o recém-nascido, o futuro do povo terena é revelado e transmitido de forma visual. Para dar a representatividade histórica, a HQ se utilizada predominantemente de elementos visuais para compor a estrutura da linguagem dos quadrinhos indo ao encontro da estrutura linguística das línguas de sinais - visual-espacial. Assim, o processo de identificação dos surdos brasileiros se dá de forma natural. O objetivo geral da narrativa foi apresentar a história do povo terena de forma visual e acessível aos surdos ou ouvintes pertencentes ou não a essa comunidade.


Imagens da história em quadrinho (Kaxe a pajé surda), que será lançada ainda em 2020

Imagens da história em quadrinho (Kaxe a pajé surda), que será lançada ainda em 2020

A linguista Kelly Priscilla Lóddo eo acadêmico  Cezar Ivan de Souza: inclusão

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Bruaca: vivências e produtos culturais

 O projeto Bruaca é uma iniciativa comunitária, desenvolvida nas comunidades tradicionais do Pantanal que se desenvolve por meio de ações de pesquisa, documentação e divulgação do saber ancestral dessas comunidades por meio de vivências e produtos culturais. Nossa iniciativa busca a valorização do Patrimônio Cultural Material e Imaterial das Comunidades Tradicionais do Pantanal de MS. Desenvolvemos ações de pesquisa, documentação e divulgação do saber ancestral dessas comunidades por meio de vivências e produtos culturais (materiais e imateriais). A iniciativa configura-se ainda como uma alternativa para a geração de renda dessas comunidades que, por estarem distantes da cidade não possuem meios para comercializar seus produtos. A comercialização de vivências como a produção de artesanato com um indígena, almoço na casa de um agricultor, o passeio de barco com um pescador; observação de aves na aldeia são alguns dos produtos oferecidos pela marca, soma-se a isso a comercialização in-lo

Crianças indígenas de aldeia terena voltam a praticar ritos e danças tradicionais esquecidos

Crianças que não conhecem cantos e instrumentos tradicionais; que não praticam ritos tradicionais. Ritos e danças tradicionais fadados a desaparecer com os anciãos à medida em que estes vão, pouco a pouco, falecendo. Não é mais este o cenário que encontramos na aldeia indígena terena Babaçú, no município de Miranda, no Pntanal de Mato Grosso do Sul. A aldeia é exemplo de que a união e o trabalho em conjunto podem promover a verdadeira transformação da comunidade. Lá, na Babaçú, em 2016 e 2017 o Instituto de Pesquisa da Diversidade Intercultural (Ipedi) foi mentor do projeto Sons da Aldeia, uma iniciativa comunitária que, com patrocínio da associação Brazil Foundation, desenvolveu atividades relacionadas ao resgate da cultura tradicional indígena terena junto a alunos da escola local. Os resultados do trabalho são sentidos quando se verifica que atos rituais que já não faziam mais parte do dia-a-dia das crianças tenham voltado a ser realizados, tais como o batism

STARTUP DE IMPACTO SOCIAL NASCIDA NO IPEDI VAI REPRESENTAR MATO GROSSO DO SUL EM DESAFIO NACIONAL DE STARTUPS

  A startup Bruaca, um projeto derivado das ações do Ipedi, venceu desafio Like a Boss, promovido pelo Sebrae (Serviço de Apoio à Micro e Pequena Empresa) de Mato Grosso do Sul e foi uma das três escolhidas para representar o estado no Startup Summit, considerado o maior evento de startups do Brasil. A Bruaca participou do processo de escolha sendo avaliada criteriosamente pelo Sebrae, passou por etapas eliminatórias de seleção, chegando à final, realizada em 27 de maio. “Esta é uma conquista de todo um grupo de pessoas que acredita na força da cultura como geradora de qualidade de vida para as comunidades tradicionais de Mato Grosso do Sul”, afirmou Denise Silva, pós-doutora em linguística, coordenadora da Bruaca e presidente do Ipedi. A Bruaca funciona como uma cesta de serviços, auxiliando na intermediação da comercialização de produtos culturais das comunidades tradicionais do Pantanal com o objetivo de gerar renda para estas comunidades, gerando impacto social positivo. At